5 de ago. de 2012

GTO Fazendo Arte em Pelotas


O grupo de teatro do oprimido Fazendo Arte, participou entre os dias 23 até 27 de julho do XXI Congrenaje e o VII Fest Art na cidade de Pelotas/RS. O Congrenaje acontece a cada dois anos e é o evento de maior estância da Juventude Evangélica da IECLB.
Nesse ano recebemos o convite para assumir a discussão do tema "Conectados com Deus, protagonistas no mundo", por meio da técnica do teatro fórum, integrado a metodologia do teatro do oprimido. O grupo apresentou duas cenas: "Retratos da Opressão" e "Cacos de Família". As cenas foram desenvolvidas a partir de relatos de jovens luteranos em oficinas desenvolvidas nas comunidades da IECLB no Sínodo Espírito Santo a Belém. Nas cenas abriu-se a janela para discutir sobre o machismo, preconceito, racismo, violência, drogas e mais. Os jovens foram convidados a fazer intervenções e a subir no palco, para reconstruir determinada cena a partir da sua percepção de um mundo mais justo.
Intervenção do Público


Nessa sessão, estudantes de teologia das Faculdades EST assumiram a transmissão do evento e da peça via live stream. Assim pudemos contar com sugestões de intervenções de jovens de outros estados do Brasil que acompanhavam ao vivo na internet a sessão teatral. O multiplicador William Berger, responsável pelas cenas, comentou que essa foi uma das poucas oportunidades no mundo que pessoas de outros lugares puderam participar das discussões do teatro fórum via internet.
"O teatro do oprimido abre um leque de possibilidades de discussões. Poderíamos ficar o dia todo extraindo questões das cenas e a cada intervenção do público teria uma nova observação". Como relatou um jovem do Sínodo Rio dos Sinos.
Durante outro momento do Congrenaje, o GTO Fazendo Arte e integrantes do NALagoa puderam assessorar uma oficina demonstrativa de teatro do oprimido e audiovisual para os participantes. Avaliamos positivamente o envolvimento de algumas atividades da Associação Diacônica Luterana em um espaço tão prestigiado.


Antes de voltar para o Espírito Santo, no sábado, dia 28, o nosso grupo desenvolveu uma oficina demonstrativa com os jovens da comunidade luterana "Bom Pastor", em Novo Hamburgo. Depois de um delicioso almoço, no galpão do Alonso, o grupo apresentou para a comunidade o teatro fórum "Retratos da Opressão". Novamente, intervenções e um instigante bate papo sobre as cenas.
O grupo contou com o patrocínio da Fundação Luterana de Diaconia - FLD para as passagens e demais despesas nesse período. Somos gratos pelo apoio e pela oportunidade de difundir a prática do teatro do oprimido.
"O Teatro do Oprimido é um método teatral e modelo de prática cênico-pedagógica sistematizados e desenvolvidos pelo teatrólogo brasileiro Augusto Boal nos anos 1970. Possui características de militância e destina-se à mobilização do público, vinculando-se ao teatro de resistência. O termo é citado textualmente pela primeira vez na obra Teatro do oprimido e outras poéticas políticas, que reúne uma série de artigos publicados por Boal entre 1962 e 1973".
Componentes do Fazendo Arte que estiveram em Pelotas
Alex Reblim Braun, Ana Paula Brandt Gonçalves, Devair Grunewaldt Reinke, Emili Maria Fristschi Botini, Hilton Ferreira de Oliveira, Isabela Abel Gumz, Izabela Jastrow, Kéllei Feltz Pagung, Luis Guilherme Manhani, Michael Kuhn Pothin, Nicole Trabach Ratunde, Rafael Wolfgramm, Roana Clara Gums, Weidny Pierre Barros Barbosa, Willa Boecker. Multiplicador: William Berger.








Oficina demonstrativa em Novo Hamburgo

23 de jul. de 2012

O teatro Fórum no GTO Fazendo Arte



O teatro fórum ou foro é visto com uma forma de teatro bastante ousada. Nela, o oprimido (protagonista) e o opressor (antagonista) estão frente a frente, ocultada na forma de pai, aluno, policial, homossexual ou qualquer outro personagem. Esse teatro revela uma problemática real, individual ou coletiva, na qual, o oprimido não foi capaz de ‘enfrentar’ o seu opressor. Mas agora, no teatro fórum, a cena poderá ser novamente ‘vivenciada’, onde, através da participação de diversos ‘espect-atores’ poderão sugerir novas soluções (talvez até possível) para o caso do oprimido. Normalmente ao presenciar um teatro fórum há o sentimento, por parte do público, de querer intervir a qualquer momento para impedir a ação do agressor. Conforme Boal, no fórum deve conter a falha política ou social, esses erros são expressos claramente ao público. Quando a opressão chega a seu ápice os ‘espect-atores’ devem-se sentir motivados a encontrar uma ou mais formas de solução ao problema. (BOAL, 2007)
O GTO Fazento Arte conheceu a metodologia do teatro fórum em 2010, com uma oficina desenvolvida pelo multiplicador William Berger. Desde lá, a cada ano o grupo é renovado por novos participantes e re-experimenta o processo metodológico do teatro do oprimido, mas é o teatro fórum que mais atrai o interesse dos novos participantes. Nele, em cada reapresentação as alternativas e dos "espect-atores" são inéditas e desafiam os membros do GTO Fazendo Arte a discutir com novas ideias e sugestões de enfrentamentos da opressões.

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BOAL, Augusto. Jogos para atores e não-atores10.ed. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 2007

29 de mai. de 2012

O Teatro do Oprimido na cena da Associação Diacônica Luterana

“Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão” (Paulo Freire)
“Não basta consumir: é necessário produzir. Em algum momento escrevi que Ser Humano é Ser Teatro. Devo ampliar esse conceito: Ser Humano é Ser Artista! Todos os Oprimidos, independentemente de suas profissões ou ofícios, devem se tornar artistas em todas as artes para, assim, conquistarem a verdadeira cidadania. Cidadão não é aquele que vive em sociedade – é aquele que a transforma!”
(Augusto Boal. Na cerimônia de recebimento do título de Embaixador Mundial do Teatro pela UNESCO)
“Jesus manda libertar os pobres e ser cristão é ser libertador. Nascemos livres pra crescer na vida nunca ser pobres e viver na dor”
(Trecho do Cântico “Nossa Alegria”. O Povo Canta)

O cântico ecumênico “Nossa Alegria” nos diz que ser cristão é ser libertador, pois o evangelho de Jesus Cristo nos motiva à ação transformadora do mundo. Com base nessa fé ativa, a Associação Diacônica Luterana (ADL) busca a inserção de metodologias criativas e libertadoras na formação de nossos jovens e comunidades, através do que Paulo Freire chama de Ação-Reflexão; e aqui o Teatro do Oprimido de Augusto Boal, qual semente em terra boa, tem rendido muitos frutos. Vejamos um pouquinho dessa história.
No ano de 2009 a ADL recebeu sua primeira oficina de Teatro do Oprimido, metodologia criado pelo teatrólogo Augusto Boal, brasileiro mundialmente conhecido por uma proposta teatral libertadora. Quem nos apresentou o método foi o mestre em Serviço Social, ator e multiplicador da metodologia, nosso atual professor e ex-aluno de nossa casa, William Berger.
A partir daquele momento nossos jovens, com o auxílio e empenho de nosso professor e coordenador pedagógico Alex Reblim Braum, se empenharam no estudo e na prática de exercícios, jogos e técnicas de Teatro do Oprimido e solicitaram uma maior aproximação da nossa casa ao método através de uma reflexão com base no evangelho libertador de Jesus Cristo.
O resultado foi a criação de uma nova disciplina nos três anos do curso de formação de lideranças comunitárias. A disciplina criada recebeu o nome de “Corpo em Expressão” e passou a ser ministrada ao lado de uma outra disciplina chamada “Contação de Histórias”, ambas embasadas em técnicas teatrais para a instrumentalização de nossos jovens e para o trabalho com grupos, instituições e comunidades da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) e parceiros.
Os estágios semanais do 2º e 3º ano na Casa do Menino de Afonso Cláudio e na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), por exemplo, os estágios intermediários em comunidades e instituições vinculadas à IECLB e a realização de atividades voluntárias em nossas comunidades, como o projeto da ADL chamado “Arte na Escola” com as escolas públicas da região, passaram a ser enriquecidos com esta metodologia que visa discutir e propor formas de transformação de realidades opressivas por meio da arte.
No início foram realizadas experiências muito especiais com o Teatro Invisível, que visa discutir em espaço público um tema com uma situação ensaiada por atores em um lugar onde a plateia não se sabe enquanto tal. Por exemplo, com essa técnica discutimos dentro da própria ADL as relações de convivência e respeito mútuo. Ao final, porém tivemos que falar que a situação gerada se tratava de uma situação teatral, pois o espaço é fechado. Isso quebra o caráter invisível, mas mesmo assim pudemos experimentar a potência desta técnica.
No ano de 2010 o então grupo de teatro da ADL assumiu a identidade, o nome e o reconhecimento pela rede internacional de Teatro do Oprimido  enquanto Grupo de Teatro do Oprimido Fazendo Arte. O professor Alex Reblim Braum foi a Vitória buscar mais formação com o Núcleo de Praticantes de Teatro do Oprimido vinculado à Pró-reitoria de Extensão da Universidade Federal do Espírito (UFES) e estabeleceu contato com a rede nacional do Teatro do Oprimido. O multiplicador William Berger então em realização de seu mestrado em Serviço Social na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), pesquisando o Teatro do Oprimido com os indígenas Tupiniquim de Aracruz-ES, e em aprofundamento de sua formação no Centro de Teatro do Oprimido no Rio de Janeiro, retornou de passagem à casa para uma segunda oficina de aprofundamento no ano de 2011 e a partir daí o grupo intensificou suas atividades oferecendo/multiplicando mais de uma vintena de oficinas demonstrativas de Teatro do Oprimido e apresentações/sessões de Teatro Fórum por todo o ES.
Ao todo foram realizadas 3 dessas oficinas em Barracão (2010 e 2011), 3 em Barra de São Francisco no Norte do ES (2010 e 2011), 1 no SESC de Guarapari (2009), 1 em Santa Maria de Jequitibá (2011), 3 em Laranja da Terra (2011), e 1 em Pancas com todas as lideranças da União Paorquial Norte (2010).
Foram realizadas apresentações de cenas e sessões de Teatro Fórum no SESC Guarapari (2009), 2 na Praça Aderbal Galvão em Afonso Cláudio (2011), na Prefeitura Municipal de Afonso Cláudio (2011), para o grupo de lideranças da OASE em Santa Maria de Jequitibá (2011), no encontro de mulheres na paróquia de Afonso Cláudio (2011), na Praça de Barra de São Francisco, no Norte do ES (2010), 2 apresentações na Escola Elvira Barros (2010 e 2011) e 1 apresentação no Dia Mundial do Teatro em Afonso Cláudio (2012) com temas como racismo, direito à educação, família e juventude, drogas, violência juvenil, violência contra a mulher, autoritarismo, entre outras .
Em 2012 o William Berger foi contratado para fazer parte da equipe de professores da ADL e assim assumiu a direção do Grupo de Teatro do Oprimido Fazendo Arte e as disciplinas Corpo em Expressão com o 2º e 3º ano. Nossos estudantes são colocados diretamente para aplicarem oficinas de Teatro do Oprimido sob sua supervisão. Só neste primeiro bimestre de 2012 oferecemos um conjunto de 3 oficinas de Teatro do Oprimido com o tema “Memória e Ancestralidade Pomerana” em comunidades pomeranas tradicionais como Califórnia em Domingos Martins-ES, Alto Jatibocas em Itarana-ES e Vila Pavão no extremo norte do ES, esta última na Semana Nacional do Museus a convite da Secretaria Municipal de Cultura de Vila Pavão; e uma oficina de 4 horas para assistentes sociais e alunos dos cursos de Serviço Social e Terapia Ocupacional da UFES.
Dessas oficinas com jovens, onde participaram não só pomeranos mas também jovens descendentes de negros e italianos, pudemos criar cenas de Teatro-Fórum e cenas da Memória Pomerana com os temas: a mulher na comunidade, juventude pomerana e as drogas, racismo e preconceito, tradição costumes e modernidade, entre outros.
A sistematização deste trabalho com nossas bases pomeranas, negras, italianas e luteranas está servindo como um rico material antropológico e sociológico para nossas reflexões teológicas e para a criação de um espetáculo de Teatro Fórum que apresentaremos no Congresso Nacional da Juventude Evangélica (Luterana) em Pelotas no RS dos dias 20 a 25 de julho de 2012.
Com a apresentação do espetáculo faremos uma sessão de Teatro Fórum com cobertura pelo sistema de TV Live Stream da internet conectados com nossas comunidades que poderão de várias partes do Brasil e até do mundo dar suas sugestões no Fórum de como fariam se estivessem no lugar do oprimido. Nossos jovens irão experimentar algumas das propostas vindas online de várias partes do Brasil e até do mundo, se houver. Esta proposta foi feita pela primeira vez no Canadá por um conhecido curinga do Teatro do Oprimido e faremos no Brasil, talvez uma das primeiras experimentações desse nível.
A sistematização escrita, fotografada e filmada de nossas atividades com o Teatro do Oprimido convergem para a edição de um livro e um DVD para circulação em nossas comunidades. Esperamos poder contar com o apoio de nossos ministros e ministras para a ampliação deste método em nossa IECLB Brasil adentro e mundo afora. 

2 de abr. de 2012

Teatro do Oprimido: memória e ancestralidade

Teatro do Oprimido:
memória e ancestralidade

Por: William berger
(ator, assistente social e multiplicador do teatro do oprimido)


EXPERIÊNCIAS teatrais COM POVOS TRADICIONAIS NO Espírito Santo: 

os pomeranos I 
(Domingos Martins)


H
 á algum tempo fui alertado pelo poeta Waldo Motta sobre trabalho do psicanalista Carl Gustav Jung. Desde a leitura de “O Homem e seus Símbolos” despertou-se uma chama de auto-conhecimento em mim. Auxiliado por Waldo, me lancei a analisar meus sonhos e os acontecimentos de minha vida desde uma perspectiva simbólica. Quando ainda estava no Rio de Janeiro, de 2009 ao início deste ano (2012), tive contato com o movimento do Teatro Negro. Em oficina no Grupo Nós do Morro, no Vidigal, conheci especialmente a artista Eliete Miranda, que dança a cultura do povo afro-brasileiro com tamanha força e intensidade a ponto de sempre emocionar seu público.
Convidado ao final da oficina para participar de sua Cia de Dança, a Corpafro, Eliete despertou em mim outra chama que veio aumentar o fogo do auto-conhecimento: a importância da memória e da ancestralidade. Durante dois intensos anos entre o trabalho de Eliete Miranda e também com o teatrólogo Amir Haddad e do antropólogo Roberto Damatta (meu professor na PUC-Rio), pude beber intensamente na fonte da cultura negra, também com minha orientadora do mestrado em Serviço Social Denise Pini Rosalém da Fonseca. Tanto Denise como Eliete pesquisam Orixás femininos: Oxum, Obá, Iansã, Nanã, Yemanjá, mergulhando nas raízes mitológicas e no universo social de mulheres-deusas e mulheres-negras da Bahia e do Rio de Janeiro. Denise também pesquisa escritoras negras dos EUA onde fez seu mestrado em Estudos Latino-americanos. Amir Haddad destaca como base de seu trabalho o Carnaval, o Futebol e o Candomblé. Roberto Damatta completa a leitura com seus clássicos “Carnavais, Malandros e Heróis” e “A Bola que Corre Atrás dos Homens”.
De posse dessa sabedoria milenar, e de nossa cultura popular brasileira extremamente diversa, onde o Teatro de Rua de Amir Haddad e o Teatro do Oprimido de Augusto Boal se tornaram o cimento de minhas práticas, passei a me perguntar, no contato com esses artistas e pesquisadores: quais são as minhas raízes, de onde vim, quem sou e onde quero chegar? Uma questão que Waldo Motta também havia me provocado em mais de sete anos de trabalho ao seu lado.
Olhei para trás e vi minha terra, o solo de onde saí, o Espírito Santo, o povo pomerano, também o negro quilombola, de onde tenho raízes com meu avô materno e o povo cigano, o qual herdei também por linhagem materna. Por parte de meu pai: os pomeranos e os alemães, também os descendentes de italianos no Brasil.
Começo esse texto falando de minhas próprias raízes, pois aprendi estar aí o fio da meada, a ponta do novelo. Puxar essa ponta, pode nos possibilitar o eterno retorno à fonte criadora da Cultura onde se encontram em estado de fusão todas as nossas lembranças que remetem à infância e inclusive aquelas das quais não lembramos, mas que fazem parte do substrato comum da memória coletiva e do que Jung chama de Inconsciente Coletivo, onde habitam os Arquétipos, imagens e princípios criadores da humanidade.


No início de 2012 decidi retornar à minha terra e o convite veio da Associação Diacônica Luterana, instituição da IECLB, para atuar na formação de jovens lideranças. O objetivo: ministrar aulas de Comunicação e Expressão e Corpo em Expressão com foco na metodologia do Teatro do Oprimido de Augusto Boal, trabalho no qual venho mergulhando desde o ano de 2004 e do qual ministrei duas oficinas na ADL em 2009 e em 2011.
Além das aulas na ADL recebi a responsabilidade de assumir junto com o pedagogo Gilmar Hollunder o Departamento de Desenvolvimento Comunitário,  a partir do qual propus à instituição oficinas de Teatro do Oprimido para as comunidades e paróquias do Sínodo, com enfoque especial em aspectos da memória e da ancestralidade.
Acompanhado de meu companheiro de trabalho e multiplicador de Teatro do Oprimido  Alex Reblim Braum, a primeira a pedir a nossa presença foi a Paróquia de Califórnia em Domingos Martins, nas serras do Espírito Santo, região fria onde os pomeranos a século e meio vêm mantendo e reiventando seus constumes tradicionais trazidos da Europa no início do século XX, quando aqui chegaram no período da imigração e fugidos do nazismo na Segunda Guerra Mundial. Seguem algumas imagens do trabalho.


Esta árvore centenária, tanto quanto o templo luterano de mais de 140 anos criam uma espécie de equilíbrio com o lago e a casa (Yin e Yang). Ao fundo há uma reserva ambiental onde prevalece a Mata-Atlântica e um clima ameno. Desenvolvemos jogos e exercícios das 5 categorias do Teatro do Oprimido: 1. Sentir Tudo que se toca; 2. Escutar Tudo que se Ouve; 3. Ver Tudo que se Olha; 4. Ativando os Vários Sentidos; e 5. Memória dos Sentidos.  Aplicamos a técnica “Ser Humano no Lixo”, do qual fizeram uma mulher que tem de trabalhar dentro e fora de casa, cuidar da roça e dos filhos, presa à casa, sem tempo para usufruir da vida na comunidade. Seguindo o costume local e uma tradição luterana, ao final da oficina nos juntamos em oração por esse povo e pela humanidade, por familiares e por nossas memórias, dessa vez em torno da árvore ressignificada com nossas experiências teatrais entre corpo, espaço, memória e ancestralidade.


O Corpo, a Árvore e o Espaço



Sentir o espaço e sua dinâmica pela presença desta árvore centenária em mim foi um ponto essencial para intuir algumas direções das reflexões entre corpo e espaço, memória e ancestralidade, propostas para o grupo adequando dessa forma técnicas de Teatro do Oprimido. O jeito doce e a simplicidade, o sorriso do povo pomerano de Califórnia parece estar plasmado no espaço. Povo e ambiente em constante troca. É claro que são muitas as degradações socioambientais, como o desmatamento e os agrotóxicos, o alcoolismo e as drogas entre os jovens principalmente, mas quando se chega a esse lugar, se respira uma aura ancestral.   
A grande árvore-mãe abraça todo o povo. Contaram-me uma história de que certa vez houve um grande conflito na comunidade, uma disputa: alguns queriam derrubar a árvore e depois de muita conversa decidiram mantê-la de pé. O sagrado se “manifestou” e a força desse ser que é a árvore e as memórias que giram ao seu redor e correm vivas em sua seiva mantém viva a comunidade.  Não é por acaso que o símbolo escolhido por Augusto Boal para o método do Teatro do Oprimido é uma árvore. A Árvore é um dos símbolos mais fortes da humanidade. As imagens falam. . .

Árvore do Teatro do Oprimido


Jovem Pomerano. Califórnia (Domingos Martins-ES) 03 de 2012.


Técnicas de Teatro do Oprimido: “Ser Humano no Lixo”


Jovem e criança pomeranas de Califórnia com a revista Metáxis do Centro de  Teatro do Oprimido


Jovens pomeranos: corpos em relação comunitária


Técnica de Teatro Imagem: “Imagem das Palavras”


Técnica de Teatro Imagem: “Imagem das Palavras”


“Viagem Imaginária”: exercício da 4ª categoria do Teatro do Oprimido (ativando os vários sentidos)

Esquema “Corpo em Expressão”


Os africanos têm na árvore Baobá o epicentro de várias culturas. Em torno dela vários povos se reúnem para realizar rituais aos seus ancestrais. A Árvore liga o que vem das profundezas com os céus.  No candomblé do Brasil, por exemplo, Iroko, é um Orixá que é Árvore. Para os orientais o corpo é comparado a uma árvore: a raiz está na base da coluna vertebral, a cabeça é seu topo os membros são galhos: somos árvores ambulantes e movimentamos florestas de pensamento sensível. 
A palavra Religião vem do latim Religare, que significa religar-se ao divino, perdido ou esquecido em nosso corpo. Para os povos tradicionais e também os povos orientais, o religare só é concebível pela experiência corporal. Teresa de Ávila encontrou esse princípio em uma época onde o corpo sofreu uma total  repressão, a Idade Média. O único conhecimento que se valorizava era o simbólico vindo apenas dos homens, a mulher era puta, bruxa ou santa. Com frequência Teresa foi acusada de todas essas alcunhas. Era apenas uma mulher que buscou a Cristo de Corpo e Alma unidos. Cristo não era um ser abstrato, ela o podia tocar e experienciar com seus sentidos.
Sem dúvida, Teresa já preconizava um pensamento Holístico (do grego holos, todo), onde somos um totalidade. Corpo espaço, consciência e ação então inteligados em uma enorme teia. Nenhum ato está isolado.
Pudemos explorar nessa oficina com os pomeranos também a investigação a respeito de uma memória corporal, pois trazemos em nosso corpo as marcas do passado. Cada corpo carrega em si a história do indivíduo, de sua coletividade e da própria humanidade.
Precisamos realizar um resgate da infância da própria humanidade como uma busca da sua ancestralidade. Isso implica a valorização de nossos povos tradicionais, sua história, sua mitologia, sua memória, seu pensamento, sua liberdade, sua dignidade. Tal atitude passa por uma retomada do sentido do sagrado e sua relação com o corpo: o divino habita em nossas entranhas. Tarefa mais que urgente para uma sociedade degradada pela perda da experiência ritual, como um resgate de nossa própria essência.

           Walter Benjamin afirmou que o contato com o divino se produz na linguagem. Destaca o lado mágico desta, quando, por exemplo, Deus nomeia sua criação. A queda do homem do paraíso lhe extraiu a capacidade de nomear as coisas no jardim do Éden; e na Torre de Babel se produziu a “superdenominação”. A linguagem podia agora ser usada para mentir e confundir, e passou a requerer o juízo para se distinguir entre ambos os aspectos (2009, p. 372).
          Não custa lembrar aqui que na cultura dos indígenas Guarani-Mbyá, mestres da oralidade, a palavra assume lugar central. Em seu ritual denominado Nimongaraí, próximo à colheita do milho e das chuvas torrenciais do final do verão, o ceu cheio de raios, manifestação de Tupã, forma o contexto onde o pajé recebe de Deus os nomes das crianças recém-nascidas. Esse nome secreto, dado apenas aos que fazem parte de sua cultura, designa o destino do indivíduo. Para alguns, seu nome indígena é tão secreto que não pode ser revelado a ninguém além do pajé e a si próprio, caso contrário a pessoa poderia perder a própria vida.



Considerações finais

           O resgate das memórias dos povos tradicionais presentes em nossos corpos, base simbólica de gestos, sons, imagens e palavras, suscita também, em nosso país, a urgência cotidiana de resgate da alteridade e da cidadania negada.

           Isso implica viver o mundo de uma maneira nova: olhar o passado em busca da origem e daí as vozes silenciadas as quais ninguém sabia que aí estavam. Assim não só os vivos, mas os mortos nos fazem demandas (2010). E é em nossos corpos que ecoam essas vozes.
          A experiência significa também os sonhos não cumpridos. O tempo em Benjamin é como um relâmpago fenomenológico. É preciso estar no meio das trevas, pois só pode ver a luz do dia quem é capaz de atravessá-las, nos lembra Santa Tereza D’Ávila. É preciso atrever-se a dar um salto sem saber o que está do outro lado. Ir ao que está silenciado em nós, desqualificado e assim naturalizado, quase como um arqueólogo. A inovação, como futuro está no passado. Temos um corpo e muitas indagações a serem feitas. Um paraíso de possibilidades ou o inferno da ignorância. "As perguntas seguem abertas" (SEPÚLVEDA, 2010).



Referências Bibliográficas

BOAL, Augusto. A Estética do Oprimido. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.

JAY, Martin. Cantos de experiencia. Variaciones modernas sobre un tema universal. Buenos Aires: Paidós, 2009.

SEPÚLVEDA, Teresa Matus. “Aportes de Walter Benjamin al Trabajo Social Contemporâneo”. Notas da Palestra. Universidade do Chile e PUC-Rio, 2010.

16 de mar. de 2012

Em comemoração ao Dia Mundial do TO

Hoje, bem cedinhos, em comemoração ao dia internacional do Teatro do Oprimido, os alunos do primeiro ano da ADL, praticaram alguns exercício e jogos dessa metodologia no campo da instituição. Ainda nesse encontro foi contado a trajetória do teatrólogo Augusto Boal, criador do Teatro do Teatro do Oprimido.