29 de mai. de 2012

O Teatro do Oprimido na cena da Associação Diacônica Luterana

“Não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão” (Paulo Freire)
“Não basta consumir: é necessário produzir. Em algum momento escrevi que Ser Humano é Ser Teatro. Devo ampliar esse conceito: Ser Humano é Ser Artista! Todos os Oprimidos, independentemente de suas profissões ou ofícios, devem se tornar artistas em todas as artes para, assim, conquistarem a verdadeira cidadania. Cidadão não é aquele que vive em sociedade – é aquele que a transforma!”
(Augusto Boal. Na cerimônia de recebimento do título de Embaixador Mundial do Teatro pela UNESCO)
“Jesus manda libertar os pobres e ser cristão é ser libertador. Nascemos livres pra crescer na vida nunca ser pobres e viver na dor”
(Trecho do Cântico “Nossa Alegria”. O Povo Canta)

O cântico ecumênico “Nossa Alegria” nos diz que ser cristão é ser libertador, pois o evangelho de Jesus Cristo nos motiva à ação transformadora do mundo. Com base nessa fé ativa, a Associação Diacônica Luterana (ADL) busca a inserção de metodologias criativas e libertadoras na formação de nossos jovens e comunidades, através do que Paulo Freire chama de Ação-Reflexão; e aqui o Teatro do Oprimido de Augusto Boal, qual semente em terra boa, tem rendido muitos frutos. Vejamos um pouquinho dessa história.
No ano de 2009 a ADL recebeu sua primeira oficina de Teatro do Oprimido, metodologia criado pelo teatrólogo Augusto Boal, brasileiro mundialmente conhecido por uma proposta teatral libertadora. Quem nos apresentou o método foi o mestre em Serviço Social, ator e multiplicador da metodologia, nosso atual professor e ex-aluno de nossa casa, William Berger.
A partir daquele momento nossos jovens, com o auxílio e empenho de nosso professor e coordenador pedagógico Alex Reblim Braum, se empenharam no estudo e na prática de exercícios, jogos e técnicas de Teatro do Oprimido e solicitaram uma maior aproximação da nossa casa ao método através de uma reflexão com base no evangelho libertador de Jesus Cristo.
O resultado foi a criação de uma nova disciplina nos três anos do curso de formação de lideranças comunitárias. A disciplina criada recebeu o nome de “Corpo em Expressão” e passou a ser ministrada ao lado de uma outra disciplina chamada “Contação de Histórias”, ambas embasadas em técnicas teatrais para a instrumentalização de nossos jovens e para o trabalho com grupos, instituições e comunidades da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB) e parceiros.
Os estágios semanais do 2º e 3º ano na Casa do Menino de Afonso Cláudio e na Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), por exemplo, os estágios intermediários em comunidades e instituições vinculadas à IECLB e a realização de atividades voluntárias em nossas comunidades, como o projeto da ADL chamado “Arte na Escola” com as escolas públicas da região, passaram a ser enriquecidos com esta metodologia que visa discutir e propor formas de transformação de realidades opressivas por meio da arte.
No início foram realizadas experiências muito especiais com o Teatro Invisível, que visa discutir em espaço público um tema com uma situação ensaiada por atores em um lugar onde a plateia não se sabe enquanto tal. Por exemplo, com essa técnica discutimos dentro da própria ADL as relações de convivência e respeito mútuo. Ao final, porém tivemos que falar que a situação gerada se tratava de uma situação teatral, pois o espaço é fechado. Isso quebra o caráter invisível, mas mesmo assim pudemos experimentar a potência desta técnica.
No ano de 2010 o então grupo de teatro da ADL assumiu a identidade, o nome e o reconhecimento pela rede internacional de Teatro do Oprimido  enquanto Grupo de Teatro do Oprimido Fazendo Arte. O professor Alex Reblim Braum foi a Vitória buscar mais formação com o Núcleo de Praticantes de Teatro do Oprimido vinculado à Pró-reitoria de Extensão da Universidade Federal do Espírito (UFES) e estabeleceu contato com a rede nacional do Teatro do Oprimido. O multiplicador William Berger então em realização de seu mestrado em Serviço Social na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), pesquisando o Teatro do Oprimido com os indígenas Tupiniquim de Aracruz-ES, e em aprofundamento de sua formação no Centro de Teatro do Oprimido no Rio de Janeiro, retornou de passagem à casa para uma segunda oficina de aprofundamento no ano de 2011 e a partir daí o grupo intensificou suas atividades oferecendo/multiplicando mais de uma vintena de oficinas demonstrativas de Teatro do Oprimido e apresentações/sessões de Teatro Fórum por todo o ES.
Ao todo foram realizadas 3 dessas oficinas em Barracão (2010 e 2011), 3 em Barra de São Francisco no Norte do ES (2010 e 2011), 1 no SESC de Guarapari (2009), 1 em Santa Maria de Jequitibá (2011), 3 em Laranja da Terra (2011), e 1 em Pancas com todas as lideranças da União Paorquial Norte (2010).
Foram realizadas apresentações de cenas e sessões de Teatro Fórum no SESC Guarapari (2009), 2 na Praça Aderbal Galvão em Afonso Cláudio (2011), na Prefeitura Municipal de Afonso Cláudio (2011), para o grupo de lideranças da OASE em Santa Maria de Jequitibá (2011), no encontro de mulheres na paróquia de Afonso Cláudio (2011), na Praça de Barra de São Francisco, no Norte do ES (2010), 2 apresentações na Escola Elvira Barros (2010 e 2011) e 1 apresentação no Dia Mundial do Teatro em Afonso Cláudio (2012) com temas como racismo, direito à educação, família e juventude, drogas, violência juvenil, violência contra a mulher, autoritarismo, entre outras .
Em 2012 o William Berger foi contratado para fazer parte da equipe de professores da ADL e assim assumiu a direção do Grupo de Teatro do Oprimido Fazendo Arte e as disciplinas Corpo em Expressão com o 2º e 3º ano. Nossos estudantes são colocados diretamente para aplicarem oficinas de Teatro do Oprimido sob sua supervisão. Só neste primeiro bimestre de 2012 oferecemos um conjunto de 3 oficinas de Teatro do Oprimido com o tema “Memória e Ancestralidade Pomerana” em comunidades pomeranas tradicionais como Califórnia em Domingos Martins-ES, Alto Jatibocas em Itarana-ES e Vila Pavão no extremo norte do ES, esta última na Semana Nacional do Museus a convite da Secretaria Municipal de Cultura de Vila Pavão; e uma oficina de 4 horas para assistentes sociais e alunos dos cursos de Serviço Social e Terapia Ocupacional da UFES.
Dessas oficinas com jovens, onde participaram não só pomeranos mas também jovens descendentes de negros e italianos, pudemos criar cenas de Teatro-Fórum e cenas da Memória Pomerana com os temas: a mulher na comunidade, juventude pomerana e as drogas, racismo e preconceito, tradição costumes e modernidade, entre outros.
A sistematização deste trabalho com nossas bases pomeranas, negras, italianas e luteranas está servindo como um rico material antropológico e sociológico para nossas reflexões teológicas e para a criação de um espetáculo de Teatro Fórum que apresentaremos no Congresso Nacional da Juventude Evangélica (Luterana) em Pelotas no RS dos dias 20 a 25 de julho de 2012.
Com a apresentação do espetáculo faremos uma sessão de Teatro Fórum com cobertura pelo sistema de TV Live Stream da internet conectados com nossas comunidades que poderão de várias partes do Brasil e até do mundo dar suas sugestões no Fórum de como fariam se estivessem no lugar do oprimido. Nossos jovens irão experimentar algumas das propostas vindas online de várias partes do Brasil e até do mundo, se houver. Esta proposta foi feita pela primeira vez no Canadá por um conhecido curinga do Teatro do Oprimido e faremos no Brasil, talvez uma das primeiras experimentações desse nível.
A sistematização escrita, fotografada e filmada de nossas atividades com o Teatro do Oprimido convergem para a edição de um livro e um DVD para circulação em nossas comunidades. Esperamos poder contar com o apoio de nossos ministros e ministras para a ampliação deste método em nossa IECLB Brasil adentro e mundo afora.